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Ancestralidade Sateré-Mawé mantém tradição indígena viva com o ritual da tucandeira x6b5v

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Indígenas da aldeia Inhãa-bé realizando o ritual da tucandeira - Foto: Daniel Boechat/Portal Norte 3cm1j

No coração da Floresta Amazônica, a dor não é punição. É aprendizado. Entre os Sateré-Mawé, a transição para a vida adulta a pelo ritual da tucandeira, com luvas recheadas das formigas com a picada mais dolorosa do mundo.

Na aldeia Inhaã-bé, localizada na margem do rio Tarumã-Açu, no Amazonas, os jovens Hamã e Everton fazem o ritual. Em contextos diferentes, uma vez que um deles está na décima vez e o outro, na segunda. Mas com o mesmo propósito.

Eles am, com orgulho, por uma experiência que atravessa gerações e ajuda a forjar guerreiros. O sofrimento controlado é interpretado como uma oferta aos espíritos protetores da floresta, pedindo bênçãos e sabedoria.

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A formiga, a lenda e a dor lendária 5n823

Conhecida como formiga tucandeira ou formiga-bala, a Paraponera clavata é o inseto com a picada mais dolorosa do mundo. No índice Schmidt de Dores e Picadas, ela alcança o nível mais alto.

NÍVEIS DE DOR by Daniel Boechat

Além da capacidade de ar a dor de aproximadamente 50 formigas, a preparação dos guerreiros indígenas envolve o respeito pela cosmovisão ancestral e a manutenção de uma rica cultura.

Para os Sateré-Mawé, a formiga é vista como um ser sagrado, guardiã da força e da natureza. O ritual inicia com jovens a partir dos 12 anos e marca a entrada deles no mundo espiritual dos adultos, com mais responsabilidades pela comunidade e pelos símbolos.

“A primeira vez tu se sente mais confiante, ainda não sentiu a dor, acho que a terceira foi a que doeu mais. Para a décima, estou tranquilo, mesmo com mais formiga. E a gente compete pra ver quem aguenta mais tempo. Dói por umas 12h, 15h. Depois de completar os 20 ciclos já posso escolher uma família, ser um bom caçador, pescador”, diz Hamã Sateré, de 14 anos, sobre o ritual.

O ritual onde cada detalhe conta 5l1612

A preparação começa cedo para a transição de criança para adulto e, desde pequenos, a expectativa é grande. “Desde criança ouço sobre isso, quando tinha uns 6 anos começou. E quero que meus filhos façam também o ritual, ajuda a ser mais forte, a pensar melhor”, conta Hamã Sateré.

No dia do ritual, a mente e o corpo precisam estar em sintonia, com alimentação restritiva. Isso tudo não só para aguentar a grande quantidade de formigas, mas para ar por até 20 minutos. E ar por isso 20 vezes para completar o ciclo.

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Hamã e Everton participam de todo o processo, a partir da coleta de formigas com técnicas como o instrumento buzina. As formigas, que chegam a medir 2,5 cm, ficam guardadas em um bambu, sendo sacudidas para que não escapem.

As mulheres têm participação ativa no ritual, na confecção das coroas, na retirada de folhas de caju e no momento da consagração. Com as folhas, um caldo é feito para mergulhar as formigas tucandeiras para que adormeçam, no que pode durar até 30 minutos.

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Depois das luvas feitas, o que resta é pintar as mãos com tinta de jenipapo e colocá-las em contato com as formigas. Isto feito, os participantes começam a ordenar-se para dançar, acordar a “mãe Terra” e sentir os efeitos da toxina.

Eles devem demonstrar bravura e sustentar as mãos para cima, entoando cânticos tradicionais. A dança circular, comunitária, ajuda a lidar com o veneno da formiga tucandeira e dura aproximadamente três músicas.

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A dor atua como agente de reflexão, força e pertencimento. Produz, com o tempo, alterações na consciência, segundo os Sateré-Mawé.

O olhar de quem participa é de dor, mas também de determinação, com uma mudança perceptível no ambiente durante o período em que ocorre.

Finalizar o ritual significa estar apto para a caça, para assumir responsabilidades e construir famílias. Apesar de enfrentar uma das piores picadas de insetos no mundo, a certeza dos participantes é de manter o ritual vivo e perpetuar com os futuros guerreiros da aldeia.

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